28.2.06

Desejo


Há torres, pausas, terrores
e pedras, e tristezas, e amores
dos olhos da morte escondida,
dividida.
Mas recordo-te nas gotas do silêncio, no vazio.
Na água que me escorre a visão, como um rio.
Como puderei perder-te.
Se a distância das folhas faz-me conhecer-te
na seiva, nos castanhos
feitos letras, sentimentos sentidos de tamanhos
variávies, e limpos, e puros.
Que dizem em olhares escuros,
que os dias tristes e maduros,
são flores em forma de beijo.
Desejo.

Molero

24.2.06

Mundo novo

Espelhai o novo mundo que
da guerra e do tempo escorre o sangue turvo
e quente, e solto espera o insulto
dos Homens da guerra que destroem o mundo, e o império.
Mas será a guerra dos Homens a sério?
Será o mundo dos Homens que apenas respiram ganhar?
Dos Homens que ao passar
vencem os fracos e os que desistem de lutar?
Ou será dos que comem no prato da derrota?
E respiram o ar da rota
do fracasso, do desprezo e do amarelo viver.
Será isso perder?
Ou apenas o combater
dos Homens grandes e valentes?
Que da derrota farão vitória,
e do fracasso farão glória.

Molero

15.2.06

Sete ilusões, sete

rasga-se a ilusão com um olhar
de uma face da lua que se descobre
e de ti vem a voz que encobre
a voz da lua, e do luar.

o cheiro azul de te chamar,
do sol, das estrelas e do pobre
de mim, que de mendigo fará nobre
o amor que em ti repousar.

um simples movimento, um som
a que o meu olhar tem quase o dom
de passar por ti e não notar

que o sorriso no teu rosto é ironia.
E é em torres de palavras que se anuncia,
o que será afinal o teu olhar.

Molero

13.2.06

Olhar os dias

Naqueles dias vermelhos falavas-me de intenções.
Dos corações dos poemas amarelos, desatentos.
Em que falam os sentimentos cinzentos.
Estamos cansados! Eu, tu e as nossas emoções.

Neste dia caminhas pelas linhas dos jornais
e eu detenho-me ao ver-te, como antigamente,
olhando o teus olhos que deslizam lentamente
pelas linhas escuras que te levam ao meu cais.

Nestes segundos o teu olhar mudou, encolheu.
Já não te vejo a olhar para mim como quem descobre o que perdeu.
Agora as teus olhos já não são azuis, pensantes,
são só caminhos para fora de mim, como eram antes.

Molero

7.2.06

Na minha cinza

Fecha-me o olhar e continuarei a ver o teu sorriso,
tapa-me os ouvidos e ouvirei a tua voz.
Até sem pernas chegarei até ti.
Até sem voz te conseguirei chamar.
Corta-me os braços: continuarei a acariciar a tua face,
com as palavras como se tivesse mãos.
Mata-me o corpo e sentir-te-ei no pensamento.
Se ainda assim me eliminares o pensamento,
permanecerás na minha cinza.
Para sempre.

Molero

(variação do poema 'No meu sangue' de Rainer Maria Rilke)

6.2.06

Palavra escondida

Não me escondam o chão que piso
aqui onde o céu oferece o que emprestou
o solo que me trouxe é onde preciso
de encontrar o eu que já não sou.

Não me tirem a palavra em que digo
que o poema da tragédia é o verdadeiro
Ergo-me e clamo pela vida em que estou contigo
e sinto o teu adeus como derradeiro.

Aqui nada me diz que as palavras são
o alimento da alma e do coração

Aqui ninguém me diz que os poemas são
a ponte que levará o Homem até à razão.

Molero