17.6.06

A imensidão da sede

Fui enganado pela leveza obscena do teu Passado,
Saberia eu que as pedrinhas no sapato eram já pedaços teus,
nesta cadeira, agora, esperneio de dor
nos braços longos das palavras.
Aquele é o chão que fecundo foi, e limpo e cuidado deu, e os teus dedos o tocaram.
Os meus dedos são feitos de negro, de pólvora com unhas
e carne, como lava queima.
Escondo-me dos teus dedos para sempre,
tapo o que sobra com as palavras da fome que ferve.
E ser migalha, ser quebradiço, ser delgado como cabelos cegos. Nesta cadeira, agora,
escondo-me do fogo cruzado sobre as vistas, sobre o peito.
Centro em mim um medo de rato, um medo de fraco. Tive em mim a convicção dos leões,
agora, nesta cadeira, não me sobram os nomes e abundam-me os verbos. Não soube o que
disse, não soube o que não disse. Não soube. Não. Linha de
rosto em militar apatia, da letargia,
da vida fugaz dos meus dedos de fome.
É esta a tarde em que fingi desinteressar-me, fabulei não ter fome.
A cicatriz permanece hirta dentro do meu lábio.

Voltei a esticar os braços tentando unir-nos com a mão.
Saberei eu que já se não une o que foi quebrado?
Não sei se a fome se mata com balas de impossível.
Não sei se consigo fazer do medo escudo.
Não sei se matarei a fome com ele.

Fui, nos teus dedos, uma gota na imensidão da sede.

Molero

1 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Great site loved it alot, will come back and visit again.
»

6:15 da tarde  

Enviar um comentário

<< Home